por Don Codling
Para chegar a conclusões sobre o caráter fundacional dos dons, será necessário examinar as passagens que têm sido tomadas para ensinar que eles são fundacionais, ou seja, Efésios 2:19-22 e Atos 1:6-8, 21-22. Vamos olhar também porções de 1Coríntios 14, que salientam a finalidade dos dons (edificação e culto), que podem ter valor fundacional mas também têm valor contínuo para além do período de fundação.
Efésios 2:20 fala dos gentios “... edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular”. Aqui há uma clara evidência ao trabalho de ambos, apóstolos e profetas, funcionando como elementos caracteristicamente fundacionais. Mas a fundação propriamente dita deve ser entendida como Cristo (1Co. 3:11), a pedra angular. A fundação foi estabelecida sim pelos apóstolos e profetas, mas quando em seu ministério eles deram testemunho de Cristo e de sua obra salvífica. Ao afirmar que o fundamento é Cristo, toda revelação de Cristo é certamente incluída, o que significa que a doutrina apostólica é parte dessa fundação[1]. O imediato significado dos “profetas” refere-se aos do Antigo Testamento, como Paulo vinculando os líderes religiosos e despenseiros da palavra de Deus da antiga e nova alianças, assim como foram comparados os períodos da antiga e nova alianças, e a posição dos gentios em ambos. No entanto, a progressão do pensamento a partir de 2:20 nos traz para a mesma combinação de apóstolos e profetas em 3:5 e 4:11, em ambos os casos os profetas em questão são os da Igreja do Novo Testamento. Assim, o contexto implica que em 2:20 os profetas também incluem aqueles do Novo Testamento, embora não necessariamente para substituição dos profetas veterotestamentários. Isso leva à conclusão assegurada de que o trabalho de pelo menos dois dos dons de revelação é fundacional.
Mas já foi visto que Hebreus 2:1-4 fala de testemunhas oculares sendo confirmadas pela operação de milagres. Um vez que os apóstolos são a principal parte do corpo de testemunhas oculares, isto conecta imediatamente os sinais, prodígios e milagres ao trabalho de fundação. Além disso, 1Coríntios 14:5 mostra que as línguas interpretadas são equivalentes a profecia. Neste sentido é sugerido que as línguas interpretadas também tiveram um papel fundacional. Na verdade é possível que todos os dons de revelação tenham tido um papel fundacional, embora seja certeza que apenas os apóstolos e profetas tinham esse papel nesse ponto. Os outros dons têm sido associados aos apóstolos e profetas, e não para o trabalho de fundação.
Se for demonstrado que todo o trabalho dos apóstolos e profetas consistia no estabelecimento de um fundamento, então todos os dons devem ter um papel fundacional. Se não puder ser demonstrado que toda a obra dos apóstolos e profetas foi fundacional, então não pode ser comprovado que os outros dons têm qualquer papel fundacional. Mas será que Efésios 2:20 não mostra que toda a obra dos apóstolos e profetas foi fundacional? Não. O texto apenas declare que os apóstolos e profetas estabeleceram uma fundação sobre a qual os gentios foram construídos. Eles também podem ter feito muitas outras coisas no seu serviço a Cristo, sem a menos transgressão deste texto. Mas há algo que possa ser adicionado à fundação que está posta quando esse fundamento é Cristo?:
Chantry está correto quando insiste que a fundação do ensinamento apostólico foi firmada de uma vez por todas. Efésios 2:20 certamente implica nesta verdade. No entanto, o versículo vinte e um vai falar de um crescimento contínuo ao invés de uma estagnação definida em nível de fundação. Todo o edifício está crescendo em Cristo, e ele não é apenas a fundação, mas também a pedra angular. Ele está envolvido e todo o edifício fortalecendo-o e sustentando-o. Esse prédio não cresce apenas através da adição dos remidos dia após dia e assim como doutrina é englobada na fundação também é englobada no crescimento. Cada parte desse edifício, cada cristão propriamente dito, está crescendo dia a dia em Cristo e isso inclui o crescimento no entendimento, bem como o crescimento na santificação[3]. A fundação não pode ser expandida, mas a superestrutura deve crescer. E se tal crescimento é em Cristo como Paulo descreve, não é nenhuma desonra para Cristo sugerir um crescimento no conhecimento de Deus edificado sobre a fundação, mas não necessariamente dedutível a partir dele. O que isso significa na prática, hoje, é que esta passagem não proíbe (ou apoia) a continuação do exercício dos dons de revelação, desde que eles não sejam colocados como adições à fundação, ou seja, às Escrituras canônicas.
Outra passagem indicando que os dons de revelação têm um papel fundacional é Atos 1. Nos versículos de seis a oito, quando os apóstolos perguntaram sobre a vinda do reino, foram orientados a aguardar a vinda do Espírito. Não lhes foi dada uma data para o restabelecimento do reino, mas foi-lhes dito que seriam testemunhas do poder do Espírito. É evidente que este testemunho em poder tem seu papel no trabalho da fundação do reino. Em seguida, os dons que os apóstolos receberam no Pentecostes foram para sua obra de fundação. Eles eram as testemunhas oculares autorizadas, embaixadores oficiais do rei a fim de estabelecer os fundamentos de seu domínio. O papel deles era, no mínimo, primeiramente fundacional.
Por conseguinte, sabemos que Matias foi escolhido para substituir Judas com o propósito de preencher aquele rol de testemunhas oficiais (At. 1:15ss). Por outro lado, Deus também separou Paulo especialmente para o ministério entre os gentios. Além de Matias e Paulo, nenhum outro foi escolhido, e a morte de João sinalizou o desaparecimento do apostolado deste mundo. No entanto, isso não implica concluir necessariamente que os dons associados aos apóstolos cessaram. Tais dons também tiveram efeitos para além de sua utilização na obra de fundação dos apóstolos. Esta passagem, então define o ofício apostólico como conectado ao período de fundação do reino tão intimamente que a função terminou com o fim desse período. Entretanto, a mesma definição não pode ser aplicada aos outros dons de revelação, e assim não subsidia qualquer razão para concluir que tenham cessado.
1 Coríntios 14 demonstra positivamente que outros dons têm finalidades não necessariamente fundacionais. O primeiro versículo ajuda a apoiar a distinção que tem sido sugerida acima, ou seja, a diferenciação entre o apostolado e os outros dons. É fato também que os coríntios foram orientados a buscar os dons espirituais, especialmente o dom de profecia. Na lista ordenada em 1 Coríntios 12:28, a profecia foi o segundo dom. O fato de os coríntios estarem buscando especialmente por isto, em vez do apostolado, é indicativo do fato de que a função apostólica foi limitada de forma que a profecia não foi. Isto não prova que os profetas continuaram para além da primeira geração, mas faz com que uma linha divisória muito tênue permita isso. Os apóstolos foram limitados a um seleto grupo que teve de desaparecer. Se todos os coríntios poderiam ser encorajados a aspirar pelo dom da profecia, então não havia motivo inerente ao dom que exigiria seu desaparecimento.
Os primeiros vinte e seis versículos de 1 Coríntios 14 enfatizam repetidamente que um dos propósitos dos dons é a edificação. Esta é a verdade indiscutível da profecia, como é explicitamente declarado nos versículos três, quatro e cinco, e implicitamente na discussão envolvendo grande parte do restante do capítulo. as houve controvérsia sobre as línguas são sempre instrumentos de edificação. Por exemplo, G. Omerly argumentou que elas não são para oração a Deus e nem primariamente estabelecidas para uso privado e edificação particular[4]. As línguas ainda não interpretadas são explicitamente descritas como edificando apenas quem fala, em vez de a igreja (1 Co. 14:4-5)[5], e são explicitamente ligadas à oração (1 Co. 14:14-17). Isto levanta um problema, no entanto, o versículo catorze torna claro que a pessoa com o dom de línguas, mas sem o dom de interpretação não entende o que diz[6]. Como então elas podem edificar? Isto não foi revelado a nós, mas aquele que fala em línguas edifica-se a si mesmo (1 Co. 14:4)[7]. Um exemplo na experiência moderna sugere uma maneira em que isso pode ocorrer. L. Christenson cita a experiência de uma mulher que estava ficando desanimada com a prática de falar em línguas:
Nós comumente pensamos sobre edificação em termos de aumento do conhecimento, mas é evidente a partir de 1 Coríntios 14:4,13,14, que isso nem sempre é o caso. Há edificação que ocorre fora da compreensão que está além do uso da mente. Edificação significa crescimento na proximidade com Deus e em obediência a ele, bem como crescimento no conhecimento. Quer entendamos ou não, as línguas eram um dom de Deus, e ele declarou que pelo menos um dos propósitos desse dom sempre foi o de edificar. A interpretação da edificação pessoal adquirida a partir do falar em línguas, era para ser entendida à igreja. O versículo doze é suficiente e usual para justificar e estender o propósito de edificação para toda lista de dons espirituais. Aqueles que estão desejosos de dons espirituais busquem a edificação da igreja.
Então, se os dons são para a edificação, logo o propósito válido deles não se limitou ao período de fundação da igreja. Certamente, a edificação é importante em que estabelece as bases da fundação, mas também certamente não se limita ao período fundacional. Nunca haverá um momento em que a edificação não seja importante para a vida individual do cristão ou para a igreja, até que todos os santos estejam de pé diante do trono de Deus. Na verdade, a própria palavra “edificação” sugere o que é construído sobre a fundação, em vez de a própria fundação[9]. Isto é muito claro em 1 Coríntios 3:10 ss., quando Paulo declara haver lançado fundamento (que é Jesus Cristo) em Corinto e outros edificaram sobre este fundamento. Para “construir sobre” (poinodoméo) em 3:10 é a mesma raiz da palavra usada no capítulo quatorze (onodoméo) e traduzida como “edificar”. Edificação é um propósito positivo dos dons espirituais, que não precisamos assumir como tendo desaparecido uma vez concluído o cânon das Escrituras, encerrando, assim, o período fundacional.
Um segundo propósito para os dons de revelação que é estabelecido em 1 Coríntios 14 é seu uso no culto. As línguas são para o uso na oração (14:14-15), e isso pode ser feito em público liderando o culto, além de ser um método para se render graças a Deus[10]. No entanto, tal oração deve ser interpretada de forma que o restante da congregação participe. Mais tarde Paulo fala da sua reunião para o culto (14:26ss.)[11], onde cada pessoa tem algo para contribuir para o desenvolvimento da adoração coletiva, quer se trate de um salmo, um ensinamento, uma revelação, uma língua ou uma interpretação. Eles são trazidos de tal forma que edificam o povo de Deus. Assim, todos os dons mencionados aqui têm um papel de adoração no culto e como o culto não cessou com a conclusão da fundação podemos certamente estabelecer que este propósito dos dons ainda deva ser exercido hoje.
Ao examinar estas passagens da Escritura notamos que os dons não foram negados, ao contrário, foi afirmado que os dons de revelação tinham um propósito fundacional, embora também tenhamos demonstrado que não há base para afirmar que esta era toda sua finalidade. A única exceção a isso seriam apóstolos, que pelo fato de serem tão intimamente ligados com a fundação da igreja pela sua comissão, a função específica do dom do apostolado teve de desaparecer uma vez que a fundação foi implantada. No entanto, os outros dons, embora úteis na definição dessa fundação, não foram tão intimamente relacionados à ela. Tem sido demonstrado que eles tinham outros fins com valor permanente para o dia de hoje e mais além.
Extraído de:
CODLING, DON. Sola Scriptura e os Dons de Revelação. Natal, RN: Editora Carisma, 2016, p.149-156.
Para chegar a conclusões sobre o caráter fundacional dos dons, será necessário examinar as passagens que têm sido tomadas para ensinar que eles são fundacionais, ou seja, Efésios 2:19-22 e Atos 1:6-8, 21-22. Vamos olhar também porções de 1Coríntios 14, que salientam a finalidade dos dons (edificação e culto), que podem ter valor fundacional mas também têm valor contínuo para além do período de fundação.
Efésios 2:20 fala dos gentios “... edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular”. Aqui há uma clara evidência ao trabalho de ambos, apóstolos e profetas, funcionando como elementos caracteristicamente fundacionais. Mas a fundação propriamente dita deve ser entendida como Cristo (1Co. 3:11), a pedra angular. A fundação foi estabelecida sim pelos apóstolos e profetas, mas quando em seu ministério eles deram testemunho de Cristo e de sua obra salvífica. Ao afirmar que o fundamento é Cristo, toda revelação de Cristo é certamente incluída, o que significa que a doutrina apostólica é parte dessa fundação[1]. O imediato significado dos “profetas” refere-se aos do Antigo Testamento, como Paulo vinculando os líderes religiosos e despenseiros da palavra de Deus da antiga e nova alianças, assim como foram comparados os períodos da antiga e nova alianças, e a posição dos gentios em ambos. No entanto, a progressão do pensamento a partir de 2:20 nos traz para a mesma combinação de apóstolos e profetas em 3:5 e 4:11, em ambos os casos os profetas em questão são os da Igreja do Novo Testamento. Assim, o contexto implica que em 2:20 os profetas também incluem aqueles do Novo Testamento, embora não necessariamente para substituição dos profetas veterotestamentários. Isso leva à conclusão assegurada de que o trabalho de pelo menos dois dos dons de revelação é fundacional.
Mas já foi visto que Hebreus 2:1-4 fala de testemunhas oculares sendo confirmadas pela operação de milagres. Um vez que os apóstolos são a principal parte do corpo de testemunhas oculares, isto conecta imediatamente os sinais, prodígios e milagres ao trabalho de fundação. Além disso, 1Coríntios 14:5 mostra que as línguas interpretadas são equivalentes a profecia. Neste sentido é sugerido que as línguas interpretadas também tiveram um papel fundacional. Na verdade é possível que todos os dons de revelação tenham tido um papel fundacional, embora seja certeza que apenas os apóstolos e profetas tinham esse papel nesse ponto. Os outros dons têm sido associados aos apóstolos e profetas, e não para o trabalho de fundação.
Se for demonstrado que todo o trabalho dos apóstolos e profetas consistia no estabelecimento de um fundamento, então todos os dons devem ter um papel fundacional. Se não puder ser demonstrado que toda a obra dos apóstolos e profetas foi fundacional, então não pode ser comprovado que os outros dons têm qualquer papel fundacional. Mas será que Efésios 2:20 não mostra que toda a obra dos apóstolos e profetas foi fundacional? Não. O texto apenas declare que os apóstolos e profetas estabeleceram uma fundação sobre a qual os gentios foram construídos. Eles também podem ter feito muitas outras coisas no seu serviço a Cristo, sem a menos transgressão deste texto. Mas há algo que possa ser adicionado à fundação que está posta quando esse fundamento é Cristo?:
O que de fato se deva adicionar a Cristo, a encarnação de toda verdade? A Igreja é edificada sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas (Efésios 2:20). Mas os carismáticos parecem acreditar que muita coisa não dita foi deixada pelos apóstolos. O fundamento da verdade deve ser ampliado se a Igreja florescer, dizem-nos.[2]
Chantry está correto quando insiste que a fundação do ensinamento apostólico foi firmada de uma vez por todas. Efésios 2:20 certamente implica nesta verdade. No entanto, o versículo vinte e um vai falar de um crescimento contínuo ao invés de uma estagnação definida em nível de fundação. Todo o edifício está crescendo em Cristo, e ele não é apenas a fundação, mas também a pedra angular. Ele está envolvido e todo o edifício fortalecendo-o e sustentando-o. Esse prédio não cresce apenas através da adição dos remidos dia após dia e assim como doutrina é englobada na fundação também é englobada no crescimento. Cada parte desse edifício, cada cristão propriamente dito, está crescendo dia a dia em Cristo e isso inclui o crescimento no entendimento, bem como o crescimento na santificação[3]. A fundação não pode ser expandida, mas a superestrutura deve crescer. E se tal crescimento é em Cristo como Paulo descreve, não é nenhuma desonra para Cristo sugerir um crescimento no conhecimento de Deus edificado sobre a fundação, mas não necessariamente dedutível a partir dele. O que isso significa na prática, hoje, é que esta passagem não proíbe (ou apoia) a continuação do exercício dos dons de revelação, desde que eles não sejam colocados como adições à fundação, ou seja, às Escrituras canônicas.
Outra passagem indicando que os dons de revelação têm um papel fundacional é Atos 1. Nos versículos de seis a oito, quando os apóstolos perguntaram sobre a vinda do reino, foram orientados a aguardar a vinda do Espírito. Não lhes foi dada uma data para o restabelecimento do reino, mas foi-lhes dito que seriam testemunhas do poder do Espírito. É evidente que este testemunho em poder tem seu papel no trabalho da fundação do reino. Em seguida, os dons que os apóstolos receberam no Pentecostes foram para sua obra de fundação. Eles eram as testemunhas oculares autorizadas, embaixadores oficiais do rei a fim de estabelecer os fundamentos de seu domínio. O papel deles era, no mínimo, primeiramente fundacional.
Por conseguinte, sabemos que Matias foi escolhido para substituir Judas com o propósito de preencher aquele rol de testemunhas oficiais (At. 1:15ss). Por outro lado, Deus também separou Paulo especialmente para o ministério entre os gentios. Além de Matias e Paulo, nenhum outro foi escolhido, e a morte de João sinalizou o desaparecimento do apostolado deste mundo. No entanto, isso não implica concluir necessariamente que os dons associados aos apóstolos cessaram. Tais dons também tiveram efeitos para além de sua utilização na obra de fundação dos apóstolos. Esta passagem, então define o ofício apostólico como conectado ao período de fundação do reino tão intimamente que a função terminou com o fim desse período. Entretanto, a mesma definição não pode ser aplicada aos outros dons de revelação, e assim não subsidia qualquer razão para concluir que tenham cessado.
1 Coríntios 14 demonstra positivamente que outros dons têm finalidades não necessariamente fundacionais. O primeiro versículo ajuda a apoiar a distinção que tem sido sugerida acima, ou seja, a diferenciação entre o apostolado e os outros dons. É fato também que os coríntios foram orientados a buscar os dons espirituais, especialmente o dom de profecia. Na lista ordenada em 1 Coríntios 12:28, a profecia foi o segundo dom. O fato de os coríntios estarem buscando especialmente por isto, em vez do apostolado, é indicativo do fato de que a função apostólica foi limitada de forma que a profecia não foi. Isto não prova que os profetas continuaram para além da primeira geração, mas faz com que uma linha divisória muito tênue permita isso. Os apóstolos foram limitados a um seleto grupo que teve de desaparecer. Se todos os coríntios poderiam ser encorajados a aspirar pelo dom da profecia, então não havia motivo inerente ao dom que exigiria seu desaparecimento.
Os primeiros vinte e seis versículos de 1 Coríntios 14 enfatizam repetidamente que um dos propósitos dos dons é a edificação. Esta é a verdade indiscutível da profecia, como é explicitamente declarado nos versículos três, quatro e cinco, e implicitamente na discussão envolvendo grande parte do restante do capítulo. as houve controvérsia sobre as línguas são sempre instrumentos de edificação. Por exemplo, G. Omerly argumentou que elas não são para oração a Deus e nem primariamente estabelecidas para uso privado e edificação particular[4]. As línguas ainda não interpretadas são explicitamente descritas como edificando apenas quem fala, em vez de a igreja (1 Co. 14:4-5)[5], e são explicitamente ligadas à oração (1 Co. 14:14-17). Isto levanta um problema, no entanto, o versículo catorze torna claro que a pessoa com o dom de línguas, mas sem o dom de interpretação não entende o que diz[6]. Como então elas podem edificar? Isto não foi revelado a nós, mas aquele que fala em línguas edifica-se a si mesmo (1 Co. 14:4)[7]. Um exemplo na experiência moderna sugere uma maneira em que isso pode ocorrer. L. Christenson cita a experiência de uma mulher que estava ficando desanimada com a prática de falar em línguas:
Esta língua estranha não estava contribuindo em nada para mim. Mas, aos poucos, tomei conhecimento de que os meus pensamentos mudaram, quando eu deixei de pensar em mim mesma a nas minhas obrigações diárias, para pensar em Deus, sua grandeza e seu amor pelo homem. Minhas atividades cotidianas passaram a ser realmente realizadas para Seu serviço, e a presença de Cristo estava mais perto de mim a cada dia. Sempre tentei viver a minha vida como um serviço a Deus a estar perto de Cristo, mas isso exigia um esforço. Agora isto vem naturalmente, quase sem esforço. Agora parece que Deus está fazendo essas coisas para mim. Não posso levar qualquer que seja o crédito por esta mudança. Toda a glória deve ser para Deus.[8]
Nós comumente pensamos sobre edificação em termos de aumento do conhecimento, mas é evidente a partir de 1 Coríntios 14:4,13,14, que isso nem sempre é o caso. Há edificação que ocorre fora da compreensão que está além do uso da mente. Edificação significa crescimento na proximidade com Deus e em obediência a ele, bem como crescimento no conhecimento. Quer entendamos ou não, as línguas eram um dom de Deus, e ele declarou que pelo menos um dos propósitos desse dom sempre foi o de edificar. A interpretação da edificação pessoal adquirida a partir do falar em línguas, era para ser entendida à igreja. O versículo doze é suficiente e usual para justificar e estender o propósito de edificação para toda lista de dons espirituais. Aqueles que estão desejosos de dons espirituais busquem a edificação da igreja.
Então, se os dons são para a edificação, logo o propósito válido deles não se limitou ao período de fundação da igreja. Certamente, a edificação é importante em que estabelece as bases da fundação, mas também certamente não se limita ao período fundacional. Nunca haverá um momento em que a edificação não seja importante para a vida individual do cristão ou para a igreja, até que todos os santos estejam de pé diante do trono de Deus. Na verdade, a própria palavra “edificação” sugere o que é construído sobre a fundação, em vez de a própria fundação[9]. Isto é muito claro em 1 Coríntios 3:10 ss., quando Paulo declara haver lançado fundamento (que é Jesus Cristo) em Corinto e outros edificaram sobre este fundamento. Para “construir sobre” (poinodoméo) em 3:10 é a mesma raiz da palavra usada no capítulo quatorze (onodoméo) e traduzida como “edificar”. Edificação é um propósito positivo dos dons espirituais, que não precisamos assumir como tendo desaparecido uma vez concluído o cânon das Escrituras, encerrando, assim, o período fundacional.
Um segundo propósito para os dons de revelação que é estabelecido em 1 Coríntios 14 é seu uso no culto. As línguas são para o uso na oração (14:14-15), e isso pode ser feito em público liderando o culto, além de ser um método para se render graças a Deus[10]. No entanto, tal oração deve ser interpretada de forma que o restante da congregação participe. Mais tarde Paulo fala da sua reunião para o culto (14:26ss.)[11], onde cada pessoa tem algo para contribuir para o desenvolvimento da adoração coletiva, quer se trate de um salmo, um ensinamento, uma revelação, uma língua ou uma interpretação. Eles são trazidos de tal forma que edificam o povo de Deus. Assim, todos os dons mencionados aqui têm um papel de adoração no culto e como o culto não cessou com a conclusão da fundação podemos certamente estabelecer que este propósito dos dons ainda deva ser exercido hoje.
Ao examinar estas passagens da Escritura notamos que os dons não foram negados, ao contrário, foi afirmado que os dons de revelação tinham um propósito fundacional, embora também tenhamos demonstrado que não há base para afirmar que esta era toda sua finalidade. A única exceção a isso seriam apóstolos, que pelo fato de serem tão intimamente ligados com a fundação da igreja pela sua comissão, a função específica do dom do apostolado teve de desaparecer uma vez que a fundação foi implantada. No entanto, os outros dons, embora úteis na definição dessa fundação, não foram tão intimamente relacionados à ela. Tem sido demonstrado que eles tinham outros fins com valor permanente para o dia de hoje e mais além.
Notas:
[1] BAYNE, Paul. An Exposition of Ephesians. Sovereign Grace Publishers, 1959, 2:20; CALVIN, John. The Epistles of Paul the Apostle to the Galatians, Ephesians, Philipians and Colossians, eds. TORRANCE, D. W.; TORRANCE, T. F., trans. PARKER, T. H. L., Vol. IX, Calvin’s Commentaries. Grand Rapids: Eerdmans, 1972, Eph.2:20.
[2] CHANTRY, Walter J. Signs of the Apostles. Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1973, p.39.
[3] BAYNE, Ef.2:21.
[4] Omerly, pp.70,75.
[5] MORRIS, L. The First Epistles of Paul to the Corinthians, The Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids: Eerdmans, 1960, 14:4-5.
[6] A possibilidade de quem fala em línguas não entender o que ele diz é rejeitado por Charles Hodge, alegando que outras considerações exigem que quem fala em línguas esteja faltando outras línguas conhecidas para si próprio, em An Exposition of the First Epistle to the Corinthians. New York: Robert Carter & Brothers, 1857, 14:13-14. Ele interpreta o versículo 13 para dizer que quem fala (ora) em língua desconhecida ore com a intenção de que ele possa interpretar a oração. Esta interpretação do versículo não é aceitável no contexto, exigindo tensa interpretação dum certo número de versículos relacionados. O versículo 14 tem ser interpretado como dizendo que as coisas que o falante compreende não são de benefício algum para ninguém. O versículo 15 deve ser interpretado de uma forma que perde completamente a força levemente disjuntiva da conjunção dé. Além disso, um sentido expandido é colocado mediante "orarei com o espírito, mas também orarei com entendimento", que tem de ser interpretado com, eu orarei de tal maneira que a minha mente também esteja dando frutos, fornecendo orações compreensíveis para aqueles que o rodeiam. Além disso, a inclusão de interpretação como um dom separado nas várias listas mencionadas no NT desafia este ponto de vista, porque quem fala em línguas sempre entendeu o que estava dizendo, então o falar em línguas e a interpretação de línguas seriam dons idênticos.
[7] Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod, Minutes of the 149th General Synod (May, 1971), p.95.
[8] Speaking in Tongues and Its Significance for the Church. Minneapolis: Bethany Fellowship, 1968, p.76.
[9] THAYER, J. H. A Greek-English Lexicon of the New Testament. Corrected ed.: New York: Harper & Brothers, 1889, pp.439-440.
[10] Morris, 1 Co. 14:14-17.
[11] GROSHEIDE, F. W. Commentary on the First Epistle to the Corinthians, Vol. VII of The New International Commentary on the New Testament. Grand Rapids: Eerdmans, 1968, 14:26ss.; Morris, 1 Co. 14:26.
---------[2] CHANTRY, Walter J. Signs of the Apostles. Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1973, p.39.
[3] BAYNE, Ef.2:21.
[4] Omerly, pp.70,75.
[5] MORRIS, L. The First Epistles of Paul to the Corinthians, The Tyndale New Testament Commentaries. Grand Rapids: Eerdmans, 1960, 14:4-5.
[6] A possibilidade de quem fala em línguas não entender o que ele diz é rejeitado por Charles Hodge, alegando que outras considerações exigem que quem fala em línguas esteja faltando outras línguas conhecidas para si próprio, em An Exposition of the First Epistle to the Corinthians. New York: Robert Carter & Brothers, 1857, 14:13-14. Ele interpreta o versículo 13 para dizer que quem fala (ora) em língua desconhecida ore com a intenção de que ele possa interpretar a oração. Esta interpretação do versículo não é aceitável no contexto, exigindo tensa interpretação dum certo número de versículos relacionados. O versículo 14 tem ser interpretado como dizendo que as coisas que o falante compreende não são de benefício algum para ninguém. O versículo 15 deve ser interpretado de uma forma que perde completamente a força levemente disjuntiva da conjunção dé. Além disso, um sentido expandido é colocado mediante "orarei com o espírito, mas também orarei com entendimento", que tem de ser interpretado com, eu orarei de tal maneira que a minha mente também esteja dando frutos, fornecendo orações compreensíveis para aqueles que o rodeiam. Além disso, a inclusão de interpretação como um dom separado nas várias listas mencionadas no NT desafia este ponto de vista, porque quem fala em línguas sempre entendeu o que estava dizendo, então o falar em línguas e a interpretação de línguas seriam dons idênticos.
[7] Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod, Minutes of the 149th General Synod (May, 1971), p.95.
[8] Speaking in Tongues and Its Significance for the Church. Minneapolis: Bethany Fellowship, 1968, p.76.
[9] THAYER, J. H. A Greek-English Lexicon of the New Testament. Corrected ed.: New York: Harper & Brothers, 1889, pp.439-440.
[10] Morris, 1 Co. 14:14-17.
[11] GROSHEIDE, F. W. Commentary on the First Epistle to the Corinthians, Vol. VII of The New International Commentary on the New Testament. Grand Rapids: Eerdmans, 1968, 14:26ss.; Morris, 1 Co. 14:26.
Extraído de:
CODLING, DON. Sola Scriptura e os Dons de Revelação. Natal, RN: Editora Carisma, 2016, p.149-156.
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