sexta-feira, 15 de abril de 2016

Nº 15



A INCESSANTE TORRENTE DE ESTRUME DE TOURO 
por Vincent Cheung

Ambos, carismáticos e cessacionistas, tendem a se envolver num debate sob o termo “dons” espirituais, mas é antibíblico repousar a questão apenas na terminologia “dons”, pois a Bíblia quase nunca usa essa linguagem para abordar esse assunto. Vemos grandes passagens sobre isso em Romanos 12, 1 Coríntios 12-14 e Efésios 4, que tratam sobre tudo isso. Há um pequeno lugar em Hebreus e outro em Pedro que falam no termo “dons”, mas Paulo é praticamente o único a fazer isso.

Todos os outros autores da Bíblia, e todas outras instâncias - centenas, e dependendo do que você considerar como relevante, até mesmo milhares de passagens - usam termos como “fé”, “graça”, “poder”, “o Espírito do Senhor”, “a mão do Senhor”, ou elas descrevem o que aconteceu, como “Então Deus disse a Abraão”, “a palavra do Senhor veio a mim”, “o Senhor ouviu o clamor de Elias, e a vida do menino voltou a ele”, “a tua fé te curou”, “o Espírito do Senhor arrebatou a Filipe”, e assim por diante. Mesmo assim, muitas pessoas, incluindo os carismáticos, estão presas discorrendo em 1 Coríntios 12 e várias outras passagens, e fazem isso sempre usando o termo “dons”. Isso distorce toda a discussão.

Então, o debate é ainda mais reduzido para “sinais” dos dons, e os carismáticos embarcam junto nisso, embora a Bíblia não faça essa distinção. Assim, toda a discussão é praticamente um lixo desde o princípio. Os reformados e os cessacionistas, são aqueles que estão orgulhosos da sua abordagem “redentivo-histórica” da Escritura, mas como é que eles não mencionam isso, e tratam o tema dessa maneira? É uma erudição fraudulenta.

Ao invés de me envolver nessa tolice, eu examino o que a Bíblia ensina sobre Deus, sobre fé, sobre cura, sobre oração, e assim por diante. Se Deus continua, então a fé continua. Se a fé continua, então os milagres continuam. Desde que a fé esteja nos homens, os milagres continuam através dos homens. Alguns desses casos são manifestações do que as pessoas chamam de “dons”, embora a Bíblia quase nunca os chame assim. As pessoas pensam que os “dons” tenham cessado - elas querem que os dons tenham cessado - não porque eles realmente cessaram, mas porque essas pessoas deixaram de ter fé em Deus.

Vamos falar sobre “dons” milhares de vezes sem que o termo “dons” seja usado uma vez. Então, nós estaremos falando sobre essas coisas um pouco mais perto da proporção bíblica. Será que Deus continua? A fé continua? A oração continua? Será que Deus continua cumprindo sua aliança - sua antiga, antiga, antiga, revelação (Lucas 13:16)? É enganoso supor que Deus opere milagres para, principalmente, confirmar a nova revelação. Novamente, apesar da Bíblia ensinar que Deus confirmou novas revelações por meio de milagres, isso é comparavelmente raro. Ele fez promessas que implicam em milagres - para homens, com homens, e por meio de homens - até o fim da história humana.

Na verdade, isso não acontecerá porque Deus vai parar de fazer milagres, mas acontecerá porque esses atos não serão mais chamados de milagres, porque as suas manifestações de poder se tornarão banais. Nesse momento, esses são chamados de “os poderes do mundo vindouro” (Hebreus 6:5). As manifestações dos dons constituem uma amostra do futuro. Elas irão “cessar” apenas no sentido de que esses poderes não mais serão limitados a casos particulares, pois haverá uma corrente constante de sabedoria e poder para nós e através de nós. Ou seja, os dons vão “cessar” somente no sentido que aumentarão em tal ponto que não mais poderão serem isolados (1 Coríntios 13:9,12).

A terminologia “dons” torna essa discussão carregada desde o princípio, e refere-se a “assinar” dons torna ainda mais sem sentido, já que agora estamos debatendo algo que a Bíblia nem sequer conhece. Na verdade, o próprio tema da “continuação” desses “dons” torna essa discussão carregada a um nível ainda mais absurdo. Não há justificativa suficiente para que esse tema, em primeiro lugar, sequer surja. Os cristãos afirmam a existência de Deus, e contra o ateísmo eles defendem a existência de Deus. Mas eles, geralmente, não precisam afirmar ou defender que Deus existe e que ele continua existindo. Talvez até mesmo os incrédulos sejam mais espertos para não carregar um debate da questão de saber se um ser eterno é um ser eterno. Por que discutir se Deus continua a fazer trabalhos especiais através dos homens, a menos que haja justificativa suficiente para fazer disso um tópico? O que eles artificialmente consideram como habilidades especiais e temporárias sempre foi a maneira com que Deus interagiu com as pessoas e através das pessoas. A questão depende de sua natureza, e não de peculiaridades dispensacionais.

Na verdade, a terminologia “dons” é tão não-essencial que, mesmo se todos os “dons” cessassem, nada mudaria. Deus ainda poderia curar as pessoas quando oramos pelos enfermos, e até impondo nossas mãos sobre eles em nome de Jesus, nós só não diríamos que isso é o dom de cura. Deus ainda poderia falar com as pessoas sempre que ele quisesse, nós só não chamaríamos isso de profecia. Enquanto o próprio Deus não cessar - enquanto ele não morrer - não haverá nenhuma diferença prática entre se alguma vez houve dons e ou se cessaram ou não.

Os cessacionistas nem sequer demonstram que existe razão suficiente para fazer disso em um tópico para uma discussão. Eles devem mostrar que algo mudou para fazerem disso uma questão legítima, e que não pode ser descartada. Eles não conseguiram demonstrar que a finalização da Bíblia tem algo a ver com se Deus continua a fazer milagres, e continua a fazer milagres através de homens.

Na maioria das vezes, Deus opera milagres seguindo algo que que ele disse na sua antiga, antiga, antiga revelação, ou simplesmente porque ele mostra sua compaixão. Deus disse que iria entregar Israel para Moisés com mão forte, porque ele se lembrou de Abraão - daquela antiga, antiga, antiga revelação - não porque ele queria confirmar uma nova revelação, embora ele também pretendeu que os milagres produzissem esse efeito. Assim, mesmo que os milagres de Jesus efetivamente confirmaram algo sobre ele (Atos 2:22), ele disse explicitamente que curou uma mulher baseado na aliança de Abraão (Lucas 13:16). Não tinha qualquer relação necessária com os dons espirituais. A cura foi o pão dos filhos (Mateus 15:26) - o seu fornecimento regular e legítimo. Depois, até as “migalhas” foram suficientes para curar alguém que não tinha, aparentemente, nenhum direito disso, exceto a alegação de fé (Mateus 15:27-28).

A base para os milagres é antiga revelação. A finalização da Bíblia não tem nada a ver com se os milagres continuam ou não, pelo contrário, essa revelação completa proporciona ainda mais base para mais milagres. O tema em si não possui razão suficiente para, até mesmo, justificar sua própria existência. Nesse momento, eu não estou ciente de qualquer um na história da teologia que tenha conseguido ir além desse ponto para legitimar esse tópico. Até agora, a própria existência desse tópico é fundada sobre fraudes. Se eu optasse por discuti-lo ante tudo isso, seria um ato de condescendência.

Eu sou um cristão. Embora eu chame o incrédulo de não-cristão, eu não me chamaria de ainda-cristão. E mesmo que, as vezes, encontre ateus, eu não me chamo de não-ateu, nem minha doutrina de contínuo-teísmo. Da mesma forma, apesar de às vezes realizar proezas de caridade teológica e tolerar o tema do cessacionismo, eu não vou me chamar de continuacionista, nem minha doutrina de continuacionismo, porque eu considero esses termos como concessões desnecessárias para essa contínua pilha carregada de estrume. Eu acredito em Deus, por isso eu acredito em milagres.


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Extraído de:
http://www.vincentcheung.com/2015/09/01/the-unceasing-downpour-of-bull-dung/

Traduzido por: Dione Cândido Jr.

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