terça-feira, 26 de abril de 2016

Nº 17



ALGUMAS SUPOSIÇÕES INCORRETAS DO PENSAMENTO CESSACIONISTA 
por Wayne Grudem

Alguns dos argumentos cessacionistas baseiam-se no apelo a determinadas passagens das Escrituras, como a afirmação de que Efésios 2.20 mostra a profecia como um dom “funcional” que não continua nos dias de hoje. Porém, conforme tenho conversado com meus amigos cessacionistas durante as últimas décadas, parece-me que, com frequência, sua argumentação é baseada não em passagens específicas das Escrituras, mas em algumas suposições. Neste apêndice, exponho cinco dessas suposições e questiono sua validade.

Os dois primeiros argumentos cessacionistas sobre a suficiência das Escrituras não estão sujeitos a crítica:

1. Deus revelou sua vontade em proposições escritas na Bíblia. (Todos os evangélicos concordam com isso).

2. As proposições escritas na Bíblia dão uma completa revelação dos padrões morais que Deus quer que todos os cristãos obedeçam durante o período da igreja. (Todos ou pelo menos a maioria dos evangélicos concorda com isso, ainda que alguns não tenham refletido sobre essa ideia anteriormente).

Contudo, depois desse ponto, a posição dos cessacionistas chega a algumas conclusões não comprovadas:

3. Portanto:
a) Não há repetições. O cessacionista pode afirmar que Deus não concede revelações subjetivas de padrões morais presentes nas Escrituras à pessoas de maneira individual.

Suposição incorreta. Se Deus revelou uma coisa em algum momento de forma escrita nas Escrituras, ele não pode ou não irá repetir parte ou toda essa revelação em outras formas à pessoas individualmente. Mas, na verdade, não há razão para ele não repetir ou lembrar alguém de coisas que já estejam nas Escrituras. Tais lembretes não teriam em si o status de revelação canônica, mas simplesmente repetiriam o conteúdo da revelação canônica.

b) Não há adições para indivíduos específicos. O cessacionista pode afirmar que Deus não pode ou não revelará orientações adicionais específicas a pessoas de maneira individual.

Suposição incorreta. Se Deus já concedeu nas Escrituras todos os seus padrões morais que se aplicam a todos os cristãos em todas as épocas, ele não pode ou não irá revelar mandamentos com orientações adicionais a pessoas específicas em lugares e momentos específicos. Porém, de fato não existe nada que impeça que Deus dê orientações específicas a uma pessoa, tal como a ordem que deu a Abraão de deixar seus pais, a orientação dada a Paulo para passar pela Macedônia ou o chamado de uma pessoa para o ministério. Além do mais, as palavras de encorajamento presentes nas Escrituras no sentido de sermos guiados pelo Espírito Santo (Rm. 8:14; Gl. 5:18), além dos muitos exemplos bíblicos de orientações específicas que Deus deu a indivíduos, podem muito bem ser entendidos como indicativo de que as próprias Escrituras nos ensinam que Deus revela sua vontade a nós, por diversos meios, de tempos em tempos.

c) Se não temos certeza se uma coisa é ou não de Deus, ela não é. O cessacionista pode afirmar que Deus não dá às pessoas qualquer revelação de sua vontade a não ser que ele também dê a quem recebeu tal revelação a certeza de que essa revelação vem dele.

Suposição incorreta (I). Se Deus revelou sua vontade de forma objetiva e sabemos com certeza que vem dele (a Bíblia), então toda revelação sua às pessoas virá de forma objetiva e saberemos com certeza que são dele. Mas o fato é que Deus pode revelar sua vontade às pessoas de maneiras subjetivas, sem que estejam plenamente revestidas da certeza de que venham de Deus, tais como intuição, “pressentimentos”, sonhos, sentimentos de estar sendo guiadas pelo Espírito Santo, etc.

Suposição incorreta (II). Nossa incerteza quanto ao fato de alguma coisa ter sido revelada ou não por Deus significa que não foi revelada por Deus. Em determinado momento, o cessacionista poderá perguntar: “Mas como você sabe que isso vem de Deus? ”, assumindo assim, sem evidência ou prova, que Deus precisa dar alguma certeza juntamente com qualquer revelação feita à pessoa individualmente. Mas o fato é que Deus pode nos dar algumas revelações sobre as quais temos alguma incerteza quanto a tal revelação ser de Deus ou não. Isso parece ser a preocupação principal do mandamento “Não tratem com desprezo as profecias, mas ponham à prova todas as coisas e fiquem com o que é bom” (1Ts. 5:20,21).

d) Não é feita nenhuma revelação sobre fatos do mundo. O cessacionista pode afirmar que Deus não dá às pessoas qualquer revelação de fatos sobre uma situação em particular dos dias atuais. Em vez disso, toda revelação deve vir por meio da observação e da investigação do mundo pelos meios comuns de nossas faculdades naturais.

Suposição incorreta. Se Deus revelou nas Escrituras tudo sobre o assunto (seus padrões morais e doutrinários para todos os cristãos de todos os tempos), ele não pode ou não irá revelar informação sobre outro assunto (como fatos particulares sobre o mundo ou sobre acontecimentos mundiais) às pessoas de hoje. Mas o fato é que ele pode revelar a algumas pessoas que um certo amigo está pronto para ouvir ou receber o Evangelho, que outra pessoa precisa de encorajamento por meio de uma ligação telefônica, que precisa de dinheiro, de oração, etc. Todas essas situações são fatos obre o mundo que poderiam, em princípio, ser obtidos por meio de nossas faculdades naturais, mas que também podem ser diretamente revelados por Deus.

e) Não há validade para os princípios difíceis de serem colocados em prática. O cessacionista pode afirmar que se o conceito de orientação subjetiva é de difícil aplicação à vida diária ou se é aplicado de maneira errada por aqueles que o seguem, então é conceito errado e não é de Deus.

Suposição incorreta. Deus nos dá somente princípios para a vida cristã fáceis de serem aplicados. Mas a verdade é que a própria tarefa de aplicar as Escrituras à vida é frequentemente difícil e normalmente é feita de forma errada. A tarefa de usas a “sabedoria”, incentivada (corretamente) pelos cessacionistas é também algo que requer prática durante toda a vida e uma habilidade que se desenvolve com o passar do tempo. O fato de que dar atenção aos fatores subjetivos é algo difícil não significa que esses fatores não venham de Deus.

Quando essas cinco suposições são trazidas à luz e analisadas, elas perdem muito de seu poder de persuasão.


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Extraído de:
GRUDEM, Wayne. O dom de profecia. Do Novo Testamento aos dias atuais. São Paulo: Editora Vida, 2004, p.391-94.

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